terça-feira, 12 de julho de 2016

Falar Gritando

  




Sete horas da manhã e enquanto trabalho sou surpreendida com uma mulher na vizinhança que fala muito alto: 

- Maria, vamos. Você vai chegar atrasada! 

Fico pensando, cá com os meus botões, por qual razão algumas pessoas precisam falar tão alto. 

Surdez? Pode até ser, quem fala muito alto mostra que não escuta bem. Mas vejo gente que fala muito alto sem ser surda. 

Há uma diferença enorme em falar alto para uma platéia de seiscentas pessoas e falar alto no aconchego de quatro paredes.
 É feio, má educação, gritar ou falar muito alto, quando é possível conversar.
 Já percebi que tem gente que adota este tipo de comportamento como mero exibicionismo. Pessoas assim precisam chamar atenção a todo o momento.
Repare que estas pessoas, além de falarem alto desnecessariamente, ainda têm olhinhos rápidos, aqueles que como uma antena parabólica giram para todos os lados. 
Elas precisam ser notadas. Vemos pessoas assim em festas, restaurantes, e nas suas próprias casas. Repare que pessoas com o pé no exibicionismo jamais lêem contextos, elas chegam falando alto em qualquer lugar, e viram automaticamente o centro das atenções: interrompem assuntos, não respeitam o silêncio, e tornam o que é privado em público. Elas vivem no palco. Repare também que normalmente o foco 
de atenção destas pessoas é um só: elas mesmas! 

A voz projetada de forma inadequada é apenas mais um atributo usado única e exclusivamente para chamar a atenção de todos. Com suas vozes altas elas interrompem uma conversa apenas ao entrar em qualquer lugar. Desviam os olhares dos presentes para si com alguma brincadeira, caso, ou o que for. Elas têm o poder de desestabilizar um ambiente, podem até ser (e normalmente são) muito simpáticas, mas simpatia não é sinônimo de boa educação.
 É o aluno que chega atrasado à aula, e sem ler o contexto, interrompe a fala do professor, enquanto cumprimenta os demais alunos. É o vizinho que fala alto demais e compartilha, sem ser chamado ou bem vindo, sua vida pessoal com a vizinhança toda. É o profissional “que chega” ao escritório como se fosse uma estrela do cinema recebendo o Oscar. Pessoas indiscretas e exibicionistas carecem de um ingrediente importante: Percepção. 

Ela é a bússola que nos conduz à adequação. É tudo na vida. Sem este chá de “se mancol”, pode-se invadir o espaço alheio simplesmente usando a voz alta. 
Sem a percepção dos ambientes e contextos é impossível ser espontâneo na vida. O espontâneo é aquele que sabe ler situações e dá as respostas mais adequadas a cada novo contexto. O exibicionista que fala alto, ao contrário, faz valer a sua vontade e age sempre de um mesmo jeito. 

Já percebi que a maioria das pessoas não se importa muito com pessoas assim, e por agirem desta forma acabam por reforçar este comportamento exibicionista, disfarçado de divertido. Esta ilusão da maioria das pessoas se dá porque normalmente este tipo de exibicionista usa a alegria ou a brincadeira como forma de chamar a atenção sobre si. Ou até seus dramáticos problemas pessoais e profissionais. 

Quando vejo uma pessoa assim, lembro-me daquelas crianças cujos pais nunca as ouvem, e para sobreviver elas desenvolvem um jeito de chamar a atenção na infância. Podem ficar doentes, deixar de comer ou falar alto em tom de brincadeira ou tragédia. Tornam-se com o passar do tempo pessoas sedutoras ou vitimizadas (tudo acontece com elas). 

O falar alto sem necessidade sempre me lembra um pedido de socorro: Estou aqui, por favor, me veja!  
Ou seja, atrás de um exibicionista sempre há um inseguro que tem a auto-estima quase no chão! 

Existem aqueles que justificam esta mania de falar alto como um hábito. Pode até ser em alguns casos, principalmente povos. 
Os italianos, por exemplo, levam esta fama. Mas já fui a casas de italianos que moram no Brasil, na qual as pessoas conversam normalmente e crianças são ouvidas e ensinadas desde cedo a falarem num tom, digamos, “normal”, sem exageros. 
Filhos podem ser ensinados a não gritar enquanto falam! 

Falar alto demais gera por parte de quem ouve uma enorme confusão mental. A capacidade de pensar quando somos obrigados a conviver com pessoas que falam gritando fica muito comprometida, já que é exigida uma maior capacidade de concentração. 

Em situações extremas, como uma briga ou um aviso de perigo, o grito se faz necessário. Falar alto é preciso para desencadear emoções contidas, aquelas que ficaram presas por muito tempo. Por este motivo é importante conversar sempre, e limpar as arestas dos relacionamentos. Assim, ninguém precisa sair por aí gritando seus problemas pessoais. Quem agüenta tudo ou vive com raiva do mundo precisa desestressar, fazendo alguma atividade que permita a catarse: lutar, jogar futebol... Enfim, jogar pra fora aquilo que está bloqueando o seu coração.

 Mas, antes de chegar ao limite, é melhor ir delicadamente percebendo e conversando sobre aquilo que o incomoda. Afinal de contas, mesmo que faça 30 atividades de desbloqueio, se não aprender a perceber seus incômodos no dia a dia e lidar com o que aparecer, elas funcionarão apenas como paliativos. Por exemplo, casais que conversam sobre aquilo que os incomoda e têm uma comunicação fluída raramente precisam partir para a “gritaria”. Conseguem discutir sem sair aos berros. 

A capacidade de falar é exclusiva dos seres humanos. Aprender a falar no tom correto a cada ambiente, grupo de pessoas e contexto significa auto-estima adequada e, conseqüentemente,0 comunicação eficaz e transparente, sem uso de jogos de manipulação, como a sedução e a confusão mental. 

O jeito com que uma pessoa fala transmite muito sobre ela. Tem um tom de voz raivoso? Fala tão baixo que ninguém ouve, denotando repressão? Grita ao invés de falar, e exagera nas brincadeiras? A fala é agitada? 

Se o nosso interlocutor não for surdo, é preciso se auto-observar a fim de entender o motivo pelo qual se fala tão alto. Precisar não precisa!

Autoria: Suely Pavan
Fonte:Desenvolvimento 

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