A escolha da simplicidade não significa viver em uma cabana no meio do nada, e sim se desfazer dos supérfluos e investir naquilo que se usa sempre, como uma boa cama.
Ter menos objetos, menos roupas, menos comida, menos, menos, menos. Algumas pessoas podem pensar que se trata de um movimento de monges budistas ou freis franciscanos, mas é apenas um estilo de vida. Numa sociedade consumista, em que o excesso predomina e que objetos (dos computadores aos carros, dos sapatos às joias) ficam obsoletos em poucos meses, a tarefa é bem complicada, mas algumas pessoas se propõem a acumular menos, seguindo a lógica minimalista do menos é mais. O objetivo é proteger o meio ambiente, pois além de não termos resolvido o problema do lixo, quanto mais se produz, mais matéria-prima é utilizada e descartada. Além disso, uma vida mais simples exige menos dinheiro e proporciona mais horas de lazer.
O princípio da moderação está em todas as áreas da vida. Da religião à gastronomia, passando pela moda, decoração ou pela intimidade nos relacionamentos, é lugar-comum pregar o cuidado com o excesso para nada passar do ponto. Mas a busca pela simplicidade é uma escolha pessoal e requer conscientização. Para a psicóloga Suzy Camacho, essa reflexão costuma acontecer em momentos de crise. “Separação, perda do emprego ou de um ente querido geralmente desencadeiam o questionamento de valores e muitas vezes as pessoas chegam à conclusão de que precisam mudar seu estilo de vida. É comum se darem conta, por exemplo, de que não querem trabalhar 15 horas por dia somente para manter um determinado padrão de consumo”, diz ela.
Este processo depende também do nível de satisfação que cada um encontra na posse. “Para algumas pessoas, como os colecionadores, contemplar suas conquistas materiais dá grande prazer. Mas, para a maioria, a alegria de ter adquirido um bem dura horas, que só uma nova compra pode trazer de volta”, explica a psicóloga Anette Lewin.
Estilo de Vida
Poucos móveis, de preferência funcionais, são exemplos de um jeito mais minimalista de viver
Se o meio ambiente apela para nosso bom senso e pede contenção, por outro o mercado e a propaganda nos dizem que é preciso ter mais e mais para chegarmos lá, sermos felizes, bem-sucedidos, belos e sedutores. A boa notícia para quem se inquieta com o menos é que a escolha da simplicidade não significa viver em uma cabana no meio do nada. A facilitadora de biodança Mônica Vilhena, 55 anos, por exemplo, mantém um estilo de vida frugal, mas não abre mão de morar em uma casa confortável, receber os amigos, viajar ou andar bem-vestida. “Eu tento me liberar de tudo que é fútil. Tenho poucos móveis, todos funcionais, e procuro comprar só o que preciso. Não estoco nada, nem comida. Compro para meu consumo imediato e as hortaliças, diretamente do produtor.”
Apaixonada por música, ela acumulou ao longo dos anos 4 mil CDs, que está doando para os amigos. “Não preciso mais deles, tenho tudo disponível na internet. Faço a mesma coisa com livros. Depois que leio, passo para outras pessoas desfrutarem da obra”.
Foi ainda na década de 1970, quando conheceu a biodança, na época denominada psicodrama, que Mônica começou a questionar seus valores. Ela escolheu trabalhar como oficial de chancelaria, um cargo administrativo dentro de consulados e embaixadas, ao invés de tentar ser embaixadora ou consulesa. “Eu queria viajar, conhecer outras culturas e pessoas, mas não desejava participar de recepções com a rainha da Inglaterra, preferia estar no pub com o povo. Fui muito cobrada por esta escolha, mas nunca me arrependi porque era coerente comigo”.
O prazer, também neste caso, é fundamental. “Escolher o que você realmente precisa e lhe dá bem-estar aumenta sua satisfação pessoal”, diz Anette.
Questão de opção
Escolha é a palavra-chave neste processo. “A sociedade assedia negativamente quem opta por se vestir sem grifes, usa sempre a mesma bolsa ou terno ou anda por aí com um carro que não é do ano. Por isso, para viver com simplicidade é preciso estar muito seguro de quem você é, do que gosta e precisa, direcionando-se pelos seus próprios parâmetros”, diz Anette.
Se você sonha com um estilo “mais lá em casa”, mas trabalha em uma empresa que exige que você seja o oposto, talvez seja o caso de mudar de emprego, acredita Anette. “Estar em um ambiente com princípios contrários aos seus pode trazer muita angústia, a menos que você tenha uma personalidade camaleônica, consiga fazer vários papéis ao mesmo tempo”, afirma ela.
Movimento vidiriano
No final do século passado, o jornalista e escritor americano de ficção científica Bruce Sterling, junto com um grupo de ecologistas, criou o movimento vidiriano (a palavra viride, em latim, significa verde) que defende maior investimento nos objetos que usamos por um longo tempo e que nos dão prazer. O colchão onde passamos oito horas por dia, o sapato que usamos o dia todo ou a cadeira na qual sentamos para trabalhar devem ser de qualidade superior. O movimento prega a valorização do que é útil em detrimento do supérfluo, sem abrir mão do prazer.
Uma vida mais simples exige menos trabalho e, portanto, sobra mais tempo para aproveitar
Para encontrar o equilíbrio antes de sair por aí se desfazendo de tudo que tem dentro de casa, Suzy recomenda que você comece olhando para seus armários e sua despensa. “Se os espaços estão sobrecarregados, há excesso. Talvez seja o momento de reavaliar o que realmente é importante e necessário para você”, diz ela.
Check list
Como não vivemos apenas do essencial, a psicóloga Irene Cardotti sugere fazer uma lista semelhante à sugerida pelos viridianos. “Separe o que acha bonito, os objetos afetivos (presentes, lembranças de pessoas queridas) e os eletroeletrônicos ou aparelhos que realizam alguma função útil. O que sobrar é supérfluo”, afirma ela.
Quando estiver dentro de uma loja, a dica é se perguntar: “Eu preciso mesmo disso? Vou usar onde? Tenho onde guardar? Eu não tenho nada parecido? É útil para mim neste momento? Fazendo isso você ganhará em praticidade, só comprando o que precisa e poderá ainda reduzir seus gastos pela metade”, ensina Irene.
Ao se libertar dos excessos motivados pela carência emocional, organizar melhor a vida e planejar o futuro você pode até ser mais feliz, acredita Suzy. “Uma vida mais simples exige menos trabalho. Sobra mais tempo para aproveitar com atividades que realmente dão prazer.”
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Comportamento
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